As rezadeiras do povo Guarani e Kaiowá estão sofrendo intolerância religiosa em suas aldeias. Já somam 17 casas de rezas que foram incendiadas nos últimos dois anos em todo o território Guarani e Kaiowá em Mato Grosso do Sul. A intolerância religiosa é um dos fatores que influenciam os ataques e vem trazendo muito transtorno nas comunidades indígenas. Com o avanço das igrejas, isso vem ficando cada vez mais frequente.
Intolerância religiosa é crime previsto na Lei no. 7.716, de 5 de janeiro de 1989, alterada pela Lei n 9.459,m de 15 de maio de 1997, e que considera crime a prática de discriminação ou preconceito contra religiões.
Muitas religiões adentraram nas aldeias, entre elas as evangélicas , umas das mais rígidas, e cada vez mais tem se alastrado nas aldeias Guarani e Kaiowá sem nenhum controle. Desde o início da pandemia, em 2020, somam mais de dez casas de rezas incendiadas nos municípios, Dourados, Douradina, Laguna Caarapã, Amambai.

Segundo Aline Kunatai Yvotyju, indígena conselheira da organização Kunângue Aty Guasu, que luta contra violação da cultura Guarani e kaiowá, os religiosos “adentram com o discurso, que vieram para fazer o bem, mas eles disseminam o ódio em nossas aldeias e dividem nosso povo. Disseminam o ódio contra nossos saberes tradicionais e contra as nhadesys ( rezadeiras), com o discurso que elas são bruxas e fazem o mal, impondo a religião dentro das aldeias com o discurso, “se não vim pelo amor vem pela dor”.
A indígena ressalta também que os anciãos são os que mais sofrem intolerância religiosa, por conta que muitos deles são rezadores, são eles que detêm os saberes espirituais e tradicionais, e a comunidade em si. A líder explica que quando a comunidade é atacada muitos dos saberes tradicionais adoecem espiritualmente, e com isso o índice de suicido entre os jovens aumenta, pelo afastamento da espiritualidade.
As casas de reza são um lugar sagrado e são de suma importância para povo Guarani e Kaiowá. É dentro dessas casas de reza que ficam os objetos sagrados do povo e são feitos os rituais . A importância da casa é essa relação como uma identidade indígena.
Aline acrescenta que “as casas de rezas são como um comprimento da terra do saber da natureza, é através das casas que os espíritos da natureza vem nos abençoar. É nela que são feitos os rituais mais importantes do povo Guarani e Kaiowá, quando a casa de reza é queimada se quebra um ciclo, está desrespeitando nossos encantados (espíritos)”.
A indígena Aline relembra uma fala de uma rezadeira, ela faz uma comparação com a casa de reza e um roteador de internet, a casa é algo que os liga com o sagrado, segundo a anciã.

Segundo o morador da aldeia Te’yikue do município de Caarapó, Fábio Turibo, os indígenas têm usado as redes sociais para denunciar as violações contra as casas de rezas e as agressões contra as rezadeiras, denunciando a intolerância religiosa, mostrando que aquilo ali é cultura indígena, não uma coisa do demônio. O indígena lamenta que seu povo tenha que passar por isso.
Para Fábio, “a sociedade tem que entender que é o nosso modo de viver e de ser indígena Guarani e Kaiowá, respeitando o nosso conhecimento tradicional, respeitando a nossa vida, nosso espaço. Nós, indígenas, não somos um problema, mas sim a solução da sociedade. A gente que sabe, como e onde preservar a natureza, a vida, a terra que é a mãe de todos”.