Talvez a maioria não o considere, pela leveza que Chico Felitti consegue impregnar nas palavras escritas. Mas eu achei forte. Já comecei achando pela capa, que mostra um casal jovem declaradamente apaixonado, os corpos se tocando suavemente de maneira quase angelical. Um filtro borrado próprio de fotos antigas, e maquiagens coloridas e divertidas te mostram logo de cara que a história ali contida é verdadeira, é cotidiana, mesmo que não seja comum.
Felitti conta nesse livro o entrelaçamento de duas vidas. A de Ricardo e de Vânia, outrora conhecido por Vagner, Vênus, Babette. A história de Ricardo já conhecida, pela reportagem publicada pelo autor em 2017, om milhares de leituras, no site BuzzFeed. O livro vem para preencher um vácuo que ficou faltando, juntar algumas peças do quebra cabeça que estava ali, mas sem mostrar a figura inteira de Ricardo Correa da Silva, um artista de rua muito famoso em São Paulo, conhecido como o “Fofão da Augusta”.
Ricardo e Vânia eram amantes, eram amigos e, mesmo separados, ficou um resquício de ambos no coração de cada um. Uma narrativa que passa por São Paulo, Araraquara, Paris. Conta história de mães, de biscoitinhos de mel, de escovas, cabelos, garotas de programa e drag queens. E que dá o nome e eterniza uma das figuras mais famosas de São Paulo, que por décadas foi chamado de um apelido que não era seu. Vai atrás da história da amante que fugiu em um ônibus para Paris, em busca de reviver uma juventude perdida cedo demais. E por fim desemboca em lembranças de uma era de ouro, de coisas que hoje se fadaram ao esquecimento. Traz lágrimas aos olhos diversas vezes, um comichão no peito que dá medo de coçar.
Texto: Maria Clara Rockel
Foto: Divulgação